segunda-feira, 26 de novembro de 2007

SOLIDÃO.... UMA ESCOLHA ?

De cara, vou logo dizendo que não acredito nesse papo de que a solidão é uma escolha. É antinatural e tudo que está nesse barco não pode ser uma opção dos humanos. Ela é, sim, uma imposição da vida, do tipo de vida que vivemos, resultado das escolhas que fizermos. Penso que tal justificativa para a solidão, é uma estratégia para suportá-la. O indivíduo repete tanto para os outros que fez essa escolha que, afinal, vive da ilusão de que sente solidão por opção. Ah! Esqueci de lhes dizer que não me refiro à escolha de morar e viver sozinho, o que é diferente de sentir solidão.Tampouco, afirmo que sentir solidão tem a ver somente com a companhia de outrem, embora esta possa evitar esse estado ou ajuda muito, se for uma companhia, ao pé da letra. Porque existem pessoas que sentem solidão mesmo morando com alguém, e na pior das hipóteses, até casadas. O que, a rigor, é uma barra.
O paradoxo social contemporâneo é convivermos o dia a dia com tanta gente e, ao mesmo tempo, nos sentirmos solitários. Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílios recente nos diz que “está aumentando o número de solitários no Brasil. São 3,8 milhões que moram sozinhos, um aumento de 137%, de 1988 a 1999. São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte estão à frente com mais pessoas vivendo isoladas. Esta pesquisa aponta somente os sozinhos, portanto, deixa de revelar o sentimento de solidão, o que evidentemente revelaria um universo ainda maior desta população”.
Agora vem a pior parte, o porquê de alguém chegar a esse estado de solidão ou as razões evidentes para explicar e/ou justificar essa condição. Olhem, penso que essas estão em terreno delicado, mesmo quando tudo indica que a responsabilidade desse sentimento é apenas de quem está nele. Se alguém a maior parte da vida ficou nesse lugar, é provável que isto se justifique por dois fatores que tanto podem se contrapor como também se complementar. Alguém sente solidão ou porque tem um gênio insuportável pra conviver com as pessoas, o que é comum se dizer a respeito de alguém que não tem amigos nem amores, ou porque há pessoas que simplesmente não conseguem ter amigos e nem amores por falta e de oportunidades e até de sorte. Sem falar nos dramas humanos que levam a essa condição e das situações geradoras de solidão. Refiro-me aqui aos doentes internados, aos chamados loucos nos hospícios, aos presos nas cadeias, aos velhos abandonados em asilos, às crianças rejeitas nos orfanatos ou aquelas sempre sozinhas sem a presença dos pais, aos mendigos nas ruas, à solidão daqueles com morte anunciada, daqueles que vão buscar uma vida melhor nas grandes cidades, aos estigmatizados por preconceitos, aos soldados em campo de batalha e até aos que têm muito poder, atormentados pelas pessoas que lhe sugam as benesses de sua companhia.
Seja por qual motivo for, a verdade é que sentir solidão é horrível, algumas vezes é desesperador. Quantas pessoas já não desejaram a morte, ou até tiraram a própria vida porque não suportaram esse sentimento, esse desespero de não ter com quem desabafar, com quem conversar, com quem sair. Inventa-se tudo pra justificar a solidão, principalmente, tratando-se das mulheres: que é bom sair ou ir a restaurantes sem ninguém, ou que viajar sozinho tem suas vantagens, que é bom ter como companhia apenas a sua própria sombra. Em suma, isso seria gol de placa, viva a liberdade alcançada!
Torno a lembrar que não se trata de uma escolha eventual, de um fato isolado, estou tratando da solidão permanente, desse sentimento que habita milhões de seres desse planeta e, em decorrência, resulta no estar sozinho. Ou seja, reafirmando, nem todo mundo que está eventualmente sozinho, tem solidão.
Mas, se fui eu que pus na mesa esse tema, vou dizer a vocês como vejo a solidão. De inicio, sou uma felizarda na minha já longa vida. De fato, senti solidão por pouco tempo, mas nas vezes em que isso ocorreu, eu fiquei muito mal. E digo mais: não sei lidar com essa condição e tenho um medo horrível de sentir solidão. Aliás, se me perguntarem qual é o meu maior medo, eu não hesitarei nenhum minuto em responder que é dessa senhora do sofrimento. Acreditem se puder, eu que moro no Rio de Janeiro, uma das cidades onde habita com muita regalia outra senhora horrível que é a violência, ainda assim, é a solidão que me mete mais medo. E nem me falem em ser uma velha com solidão porque fico literalmente apavorada, pois além desse sentimento, teria que lidar com as dependências da idade sem dispor de uma companhia pra enfrentá-la. Aí, meus amigos, eu escolheria sem pestanejar que, entre viver dessa maneira e ir dessa para o além, em estado de não solidão, eu prefiro esta última hipótese. Sentiram o meu drama?
Não sei não, mas penso que frente às imensas dificuldades de viver no mundo atual, sobretudo, nos grandes centros urbanos, estou convencida que a solidão transita da condição de um sentimento para a de uma doença dessa civilização. Pra evitar que a solidão vire doença, minha gente, só existe um antídoto: gostar de gente, pra fazer programas, pra viajar, pra constituir amizade, pra conviver. Pra viver.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

RELAÇÕES DURADOURAS... POR QUE DURAM ?

Tempos atrás uma amiga telefonou para mim e de chofre:
- Quais as razões de uma relação duradoura? - Ela perguntou.
Sem estar preparada para essa pergunta porque nunca havia pensado especialmente nessas razões, comecei a lhe falar sobre o que estava armazenado na minha cabeça, a respeito. Uma informação in off pra vocês: ela tinha se hospedado em minha casa por uma semana dez dias antes e, possivelmente, tal indagação estava relacionada a isso, uma vez que sou casada há quase treze anos, portanto, no figurino das relações tidas como duradouras para a minha geração e, com certeza, longuíssima para as gerações mais recentes.
Comecei naquele contato a apontar quais seriam as condições para uma relação de casamento longa, entre pessoas consideradas modernas, prolongar-se para além das regras vigentes.
Pode parecer o óbvio ululante afirmar que a condição mais importante é a existência de um amor profundo, aquele com cara de vida longa, forte, valente, resistente a trancos e barrancos e, em alguns casos, a barracos também...rs rs.
Coladinho a esse amor, vem a confiança mútua entre o casal, isto é, ter a certeza de que se pode contar com essa pessoa pro que der e vier, incondicionalmente, mesmo a contragosto, dependendo do fato.Traduzindo de maneira mais direta: aquela pessoa frente à qual você se despe sem medo do julgamento que virá, uma espécie de terapeuta de plantão, ao alcance de nossos desabafos e confidências.
Aí penso que decorrente da confiança, este tipo de relação nos reserva a presença de uma cumplicidade, por vezes, silenciosa, tipo você sabe o que a pessoa pensa sobre quase todas as coisas que envolvem ou não aquela dupla e, mais ainda, o que irá pensar sobre o quê, eventualmente, não estiver previsto no cotidiano daquela vida em comum. Aqui, o gostar de coisas em comum faz toda diferença.
Como dizem os orientais, quando o casal gosta muito de conversar é um prenúncio de uma vida longa em comum. Eu acrescentaria que, sobretudo, conversas nas madrugadas da vida são muito especiais e carregadas do sentido da confiança e da cumplicidade, comungadas a dois.
Não saberia também viver junto com alguém sem ter como ingrediente permanente o senso de humor. Ah! Que coisa mais gostosa na convivência! Torna a vida mais leve e, por vezes, até patética, em momentos dramáticos, por paradoxal que pareça ser. Quem vive assim, sabe do que falo.
Sinalizo, ainda, um aspecto que pode até parecer bizarro, que é o tipo de caráter dos parceiros de uma relação como componente dessa longevidade. Pensem comigo e vejam se faz sentido. Se duas pessoas num casal são da família bom caráter ou, se ao contrário, fazem parte da ramagem mau caráter, esse qualidade tem tudo para facilitar a convivência mais harmônica do casal. Parece-me claro isto, seja porque diminuem as chances da presença de conflito, de discordância valorativa frente às ocorrências cotidianas e, principalmente, pode facilitar as decisões conjuntas em momentos de opções comuns mais fundas.
No entanto, meus camaradas, essas minhas indicações nessa conversa com vocês, podem ser pura teoria. Há casos em que as pessoas ficam juntas por neurose, por pura doença, porque não têm coragem de dar a volta por cima e por aí vai. Não se esqueçam que o coração tem razões que a própria razão desconhece. E a loucura também.
Sem desconsiderar que existem ainda a magia e conspirações do universo que jogam a favor para manter juntas as pessoas e que nossa pequenez humana não será capaz de entendê-las.
De todo modo, todos nós queremos boas relações duradouras, dentro das possibilidades que esse mundo cruel nos permite. Que aprendamos a regá-las com esses temperos aqui apontados, além de buscar inovações e outras circunstâncias que favoreçam essa durabilidade.


sexta-feira, 2 de novembro de 2007

SEPARAÇÕES...QUANTA DOR!

Separações...existirá algo mais doloroso, mais sofrido? Qualquer tipo de separação dói, machuca, desalinha nossos chacras. Não é por acaso que somente uma privilegiada minoria sabe lidar com essa ocorrência.
Separações são complicadas pela própria natureza. Raramente, são as duas pessoas que querem separar e tal descompasso já é, a priori, prenúncio do que nos espera. É um sofrimento geral: de quem é deixado, de quem quer deixar, de quem não quer ser deixado, de quem está em volta. Não há reza que resolva, não há porre que suporte, não há dor que doa mais. O jeito é um só: enfrentar e se cercar de alguns cuidados para não se arrebentar demais.
Nesse drama generalizado, existe ainda um ingrediente perverso que só agudiza as dores presentes. Trata-se da culpa ocidental apostólica romana que habita, em especial, o peito daquele portador do desejo da separação. Ai! É dor profunda com cobertura de culpa. Existirá coisa pior do que sentir culpa por fazer alguém sofrer? Enfim, é pura maldade da vida amorosa para quem deseja se separar, já sai de campo com esse enorme peso de ter puxado o gatilho da dor. Vale lembrar que essa culpa começou com aquela maldita mordida da maçã pela Eva que foi possuída por esse sentimento que, portanto, tem em si o atributo da eternidade. Aliás, alguém sabe me informar o porquê da maça ter sido escolhida como vilã, logo ela que se apresenta como uma fruta tão inofensiva?
O antropólogo italiano Franco La Cecla escreveu sobre a arte da Ruptura Amorosa e divido com vocês parte de suas idéias. Para ele, no amor há a arte da ruptura assim como a da conquista, havendo também uma correspondência entre o grau de sofrimento da perda de um amor com o grau do significado desse amor. Ou seja, quanto maior o sofrimento na separação, maior terá sido aquele amor. Faz sentido, sim. Cecla classifica as separações em quatro tipos: Eu te deixo; Você faz de tudo para que eu te deixe; Você me deixa e Nós nos deixamos. Acho essa classificação verdadeira e, cá entre nós, em nossas experiências, não houve a presença de parte delas (ou de todas)?
Pensando bem: as separações são a tradução exata do tipo de amor vivido, da qualidade da relação construída. Por exemplo: relações grudentas e simbiônticas costumam ter separações dramáticas, notadamente quando apenas um só quer separar. Quem já se separou sabe do que estou falando. É um drama realmente italiano, a gente esquece o sofrimento, mas jamais o haver sofrido.
São tantos problemas, tantos sentimentos contraditórios. Impotência. Dúvidas. Remorso pelo que se fez e pelo que não se fez. Raiva do outro e de si. Enfim, é um horror generalizado. Por isso tudo, a gente tem que tentar tudo pra não se arrepender depois. Daí o melhor é buscar ajuda competente e vou direto ao ponto: fazer uma terapia de casal. Isso mesmo: fazer uma lavagem de roupa com água e sabão terapêuticos, de fino trato. Porque depois disso, ou vai ou racha.
De outro prisma, quem de nós numa relação periclitante, já não pensou que por ser tudo tão complicado numa separação, o melhor seria a solução de nossos pais e de todos seus ancestrais ocidentais: o menos pior é ficar junto até onde a vida nos levar. Até porque as relações amorosas, em geral, parecem ter, mais ou menos, o mesmo ritual: paixão, amor, crise e mais crise e finalização. Se é assim mesmo, que tal deixar como está, pra ver como é que fica? Calma, minha gente! Essa não é uma posição tão somente de acomodação. É uma leitura do real. Estarei exagerando? Em todo caso, apresento um ingrediente que amacia essa posição: refiro-me às relações fundas porque nas rasas, nem há lugar para tais conflitos, uma vez que nos tempos atuais, a intolerância na vida em comum dá logo o ultimato e a separação é prato do dia, sem grandes traumas.
De todo modo, não creio que possamos nos preparar para as separações da vida. Não há como evitar a dor, o que varia é o grau dessa dor. Penso que devemos, sim, tratá-la com delicadeza, com cuidado, com consideração. Em homenagem ao amor que uniu seres que estão se retirando da vida um do outro. Só existe separação porque antes existiu amor ou algo parecido, ou em muitos casos, durante a separação, ainda há muito ou parte desse amor.
Deixo com vocês um belíssimo poema que expressa bem o sentido dessa delicadeza com as separações:


Separação
Affonso Romano de Sant´Anna

Desmontar a casa
e o amor. Despregar
os sentimentos das paredes e lençóis.
Recolher as cortinas
após a tempestade
das conversas.

O amor não resistiu
às balas, pragas, flores
e corpos de intermeio.

Empilhar livros, quadros,
discos e remorsos.
Esperar o infernal
juízo final do desamor.
Vizinhos se assustam de manhã
ante os destroços junto à porta:
-pareciam se amar tanto!
Houve um tempo:
uma casa de campo,
fotos em Veneza,
um tempo em que sorridente
o amor aglutinava festas e jantares.
Amou-se um certo modo de despir-se,
de pentear-se.
Amou-se um sorriso e um certo
modo de botar a mesa. Amou-se
um certo modo de amar.
No entanto, o amor bate em retirada
com suas roupas amassadas, tropas de insultos,
malas desesperadas, soluços embargados.
Faltou amor no amor?
Gastou-se o amor no amor?
Fartou-se o amor?
No quarto dos filhos
outra derrota à vista:
bonecos e brinquedos pendem
numa colagem de afetos natimortos.
O amor ruiu e tem pressa de ir embora
envergonhado.
Erguerá outra casa, o amor?
Escolherá objetos, morará na praia?
Viajará na neve e na neblina?

Tonto, perplexo, sem rumo
um corpo sai porta afora
com pedaços de passado na cabeça
e um impreciso futuro.
No peito o coração pesa
mais que uma mala de chumbo.